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Chefe: como não ser

Geral | 21 de junho de 2017

Autor: Sinditamaraty

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Boa parte dos profissionais enseja alcançar cargos de chefia, seja pelo status, seja pelo alto salário. Mas será que todos estão preparados para ser um bom gestor? Estão preparados para lidar com a equipe e com as especificidades de seus subordinados?

Apesar da carência de dados oficiais sobre o tema, estudos indicam que não. Do contrário, o assédio moral não seria tão recorrente. Assédio moral, segundo o site www.assediomoral.org, é a exposição dos trabalhadores a situações humilhantes e constrangedoras, repetitivas e prolongadas durante a jornada de trabalho e no exercício de suas funções, sendo mais comuns em relações hierárquicas autoritárias e assimétricas, em que predominam condutas negativas, relações desumanas e aéticas de longa duração.

Estudo citado no relatório da Organização Internacional do Trabalho (OIT), Estresse no ambiente de trabalho: um desafio coletivo, divulgado em 2016, apontou que mais de 40 milhões de pessoas sofrem por estresse relacionado ao trabalho no interior da União Europeia. O custo, anual, estimado para tratar essas pessoas é de 617 bilhões de euros (Fonte OIT).

No Itamaraty, o assédio moral é uma realidade latente. Mas evidenciado em uma pesquisa encomendada pelo Sindicato Nacional dos Servidores do Ministério das Relações Exteriores (SINDITAMARATY), divulgada no início deste ano. 66,1% dos entrevistados afirmaram ter sofrido assédio moral nos últimos cinco anos. A maioria do assédio é cometida pela chefia, depois pelos próprios colegas de trabalho – o que mostra a desunião entre os servidores.

A indefinição das carreiras e a segregação que ocorre entre elas é terreno fértil para o assédio moral, segundo a coordenadora da pesquisa e do Laboratório de Psicodinâmica e Clínica do Trabalho da Universidade de Brasília (UnB), professora Ana Magnólia.

O trabalho identificou a existência de uma crise de identidade institucional no órgão máximo da diplomacia brasileira. “Esta crise de um lado fragmenta e divide forças, criando verdadeiros “feudos” e de outro, é uma oportunidade para mudar o destino da instituição, criando espaços de discussão e construção de um coletivo”.

MANUAL

Neste sentindo, de discutir e construir, vale lembrar uma matéria publicada na Revista Exame, em 2008. Há quase dez anos, mas o conteúdo continua atual. É um manual de como não ser chefe.
Compilamos abaixo os principais alertas, retirados do texto escrito por Alessandra Fontana e Marcia Rocha:

Incompetente no quê?
Na maioria das vezes, quando alguém diz que “fulano é incompetente” está se referindo às habilidades técnicas daquela pessoa. Acontece que saber fazer bem o trabalho é apenas uma das muitas competências que se exigem de um profissional hoje em dia, ainda mais de quem está no comando. "Tenho a impressão de que as empresas se preocupam apenas com a excelência técnica de seus líderes e não os preparam para se relacionar com as pessoas”, diz a médica do trabalho Margarida Barreto.

Poderosos e imaturos
Sempre houve chefes incompetentes. Talvez eles tenham aumentado em número porque a guerra por talentos criou um problema muito sério nas empresas: na tentativa de reter seus funcionários mais competentes, muitas começaram a acelerar as promoções. “O resultado é que vários profissionais despreparados chegaram ao poder”, diz a consultora Irene Azevedo, da KPMG. O conceito de empregabilidade também deve ser levado em conta para analisar o desempenho de quem está no topo: é muito positivo que cada um se julgue responsável pela própria carreira, mas existem muitos profissionais que são promovidos e ficam à mercê da própria sorte, sem nenhum tipo de apoio da empresa.

Caçadores de autoestimaEis o cenário ideal para o surgimento dos torturadores psicológicos, aqueles chefes que tratam seus subordinados como inferiores. “Esses maus líderes, cada um no seu patamar da pirâmide organizacional, se valem do antigo bordão ‘eu mando, você obedece’ e aniquilam a auto-estima das pessoas”, diz Margarida. De 1996 a 2000, ela fez um levantamento sobre os casos de humilhação no trabalho e chegou a uma triste conclusão: o assédio moral é uma realidade nas empresas brasileiras.

Donos da verdade
Errar é humano e líderes também podem cometer erros, certo? Certíssimo, mas muitos deles erram, sabem disso e mesmo assim se recusam a dar o braço a torcer, com medo de perder a autoridade sobre os subordinados. “O que eles perdem é o respeito da equipe. As pessoas sabem quando estão sendo enganadas”, diz Irene, da KPMG. Se você quer sinceridade dos seus funcionários, deve dar o mesmo a eles. Discurso e ação têm de ser rigorosamente iguais. Senão, pode dizer adeus à confiança da equipe.

Nada de feedback
Deixar para dizer tudo depois é um pecado mortal porque torna a comunicação truncada e afeta o moral e a produção da equipe. As coisas devem ser ditas na hora – sejam elas boas ou ruins. Você deve elogiar ou chamar a atenção de seus subordinados quando os fatos ainda estão frescos na memória e na emoção deles. Só não vale fazer comentários atravessados, que humilhem o funcionário. Se não gostar de alguma coisa, chame-o para conversar a sós, em tom firme, mas sem deixar a delicadeza de lado.

Supervisores e nada mais
Muitos gestores agem como inspetores de qualidade, ou seja, só se manifestam depois que o trabalho está pronto, quando não há mais nada a fazer. O correto é acompanhar o processo, interferir e dar palpites enquanto as tarefas ainda estão sendo realizadas – afinal, estamos falando de um time.

Indispensáveis e insubstituíveis
Grande parte dos gestores não acredita que formar pessoas faça parte de suas atribuições, imaginando que, assim, vai garantir sua cadeira de chefe. Há um ditado perfeito para mostrar os riscos de agir assim: “Não seja insubstituível. Quem não pode ser substituído não pode ser promovido”. Se até Jack Welch, o ex-todo-poderoso da GE, preparou um sucessor, por que você não pode fazer o mesmo?

Motivação zero
Chefes que só estão preocupados com a competência técnica da equipe deparam com um problema sério: a falta de entusiasmo do grupo. É seu papel fazer os funcionários se sentir parte fundamental do processo. Caso contrário, prepare-se para viver cercado por um bando de alienados. O segredo é aprender a falar a língua dos superiores e a dos subordinados.

UM POUCO DE PSICOLOGIA 
Alguns psicanalistas vão buscar na infância, na relação com os pais ou com quem assumiu esse papel, a explicação para a maneira como um profissional lida com a autoridade – seja na posição de chefe, seja na de subordinado. No livro The Practical Coach – Management Skills for Everyday Life (Editora Prentice Hall), Paula Caproni cita o trabalho de William Kahn e Kathy Kram, dois pesquisadores da Universidade de Boston, nos Estados Unidos. Eles descreveram três comportamentos básicos que as pessoas têm em relação ao poder:

interdependente – aparece em indivíduos que foram criados por pais que, desde cedo, se preocupavam com suas necessidades. Para esse profissional, a autoridade é boa – até prova em contrário. Eles confiam em si mesmos e nos outros. Líderes assim costumam ter um ótimo relacionamento com seus subordinados. É comum ouvir deles as seguintes frases: “Não se preocupem, estamos juntos nessa” e “o que vocês acham que podemos fazer para ajudarmos uns aos outros?”
dependente – pais que alternam períodos de carinho com outros de indiferença criam insegurança nos filhos, que ficam sem saber quando podem ou não contar com eles. Ao se tornar chefes, essas pessoas terão a convicção de que devem cuidar da equipe e, com isso, provavelmente manterão seus funcionários sempre dependentes. Caso sejam subordinados, sua marca registrada será a submissão. São daqueles que acham que o chefe está sempre certo.
contradependente – esse comportamento é típico de pessoas que tiveram pais física ou psicologicamente ausentes na infância. Essas pessoas têm uma alta dose de autoconfiança e uma descrença total no mundo que as cerca. Para elas, o chefe é absolutamente dispensável. “Quando estão no comando, não se comprometem com seus subordinados e não dão a eles nenhum apoio”, diz.

Depois desse enredo, vale a pena pensar se estamos prontos ou não para assumir um cargo de chefia. E quando chegar lá, não custa nada consultar esse manual.